A Editora Rede UNIDA e o Laboratório de Políticas Públicas, Ações Coletivas e Saúde, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (LAPPACS/UFRGS), tornam pública a chamada de textos para o livro “Literatura e saúde pública: a narrativa entre a intimidade, o cuidado e a política”, que será publicado na Série Arte Popular, Cultura e Poesia. O livro será composto por textos ficcionais, contos literários e outras formas de escrita criativa sobre a temática das “Políticas Públicas de Saúde”, ou seja, narrativas ficcionais que dialoguem com o mundo das políticas públicas de saúde. O livro será organizado pelos professores Dr. João Guilherme Dayrell e Dr. Frederico Viana Machado.
Esta chamada se destina, portanto, a todas as pessoas interessadas na escrita criativa e em se expressar artisticamente através de contos que dialoguem com o mundo das políticas públicas de saúde. Por isso, convidamos autores e demais interessados a submeterem textos ficcionais que construam suas tramas tomando como cenário tais políticas.
Ciência e literatura: encontros criativos
Como pode a literatura e a política servirem de inspiração mútua nos dias de hoje? O que o tensionamento entre ficção e realidade pode nos fazer apreender sobre as políticas públicas de saúde? A obra Sonhos Tropicais, de Moacyr Scliar, é uma referência para este projeto, ao construir um romance ambientado nas políticas públicas de saúde do início do século passado, tratando com sensibilidade os elementos do sanitarismo campanhista e articulando desde as tramas políticas arquitetadas pelas elites econômicas até a vida cotidiana da população mais pobre.
Porém, lembramos que o aparentemente inusitado elo entre Literatura e Saúde nos remonta ao século XIX, quando o escritor francês Émile Zola se inspirava em um tratado de Medicina para construir o importante manifesto do Realismo-Naturalismo. A ideia era pedir que a literatura tirasse uma fotografia da corrupção da natureza e do corpo biológico do homem com suas patologias que levam aos maus hábitos para, então, gerar um corpo social saudável: da mesma forma como fazia a ciência médica. Literatura e Medicina, no caso, complementando-se para normatizar o comportamento social e o uso dos corpos.
Ao contrário, sobretudo a partir do século XX, a arte passa a se confrontar com a norma e apresentar, por meio de formas variadas, condutas alternativas; assim como as ciências da saúde, especialmente após a experiência dos campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial, consideram a importância da informação para prover segurança na prática dos diferentes modos de usufruto do corpo.
Assim, convocamos a criatividade de todas e todos que gostariam de refletir sobre a realidade das políticas públicas no Brasil, com narrativas que tensionem a realidade e a ficção. Estas narrativas podem envolver variados períodos históricos, variadas políticas públicas, categorias sociais diversas, diferentes enfermidades, peregrinações nos sistemas de saúde, burocracias que desafiam a vida, corpos doentes ou adoecidos, vulneráveis ou vulnerabilizados, enfrentando kafkianos funis burocráticos do Estado, ou criando formas alternativas de vida, desbravando a selvageria do capitalismo, desvelando nuances do sistema sensíveis às fragilidades do corpo e da alma.
O biográfico e o histórico poderão, então, ser conjugados com a invenção, assim como os fatos inverossímeis, fantásticos, insólitos ou mitológicos podem servir para matizar o contato do corpo com a norma, o Estado e as políticas públicas da saúde. E com isto mostrar antigos problemas como, por exemplo, o higienismo, ao qual Machado de Assis já ironizava com a personagem coxa Eugênia, em Memórias Póstumas de Brás Cubas; apontar futuras soluções, além de outros lugares ainda desconhecidos, que somente a escrita e a imaginação, ao acabar com o elo desgastado ao qual as palavras submete as coisas no uso cotidiano, podem dar lugar.
Maiores detalhes: https://www.ufrgs.br/lappacs/2019/01/09/literatura-e-saude-publica-a-narrativa-entre-a-intimidade-o-cuidado-e-a-politica/